Em 13 de julho de 2017, após uma grande mobilização do governo Temer e de sua base parlamentar, foi aprovada a reforma trabalhista, cuja vigência se deu a partir de 11 de novembro de 2017. Passados mais de 5 anos de sua efetivação, e após ter prometido, em sua exposição de motivos, aprimorar as relações do trabalho, combater a informalidade da mão-de-obra, valorizar a negociação coletiva, além de gerar (irreais) 6 milhões de novos empregos, o que, efetivamente, essa reforma conseguiu produzir?
O aumento de postos de trabalho formal, sua principal argumentação, não ocorreu como esperado. Entre o quarto trimestre de 2017 e o de 2022, observou-se um aumento de cerca 2,6 milhões de empregos formais com carteira de trabalho assinada, gerados pelo setor privado brasileiro. O volume destes empregos, manteve-se relativamente estável durante grande parte do período em cerca de 34,5 milhões, reduzindo em seu mínimo para 30,9 milhões no terceiro trimestre de 2020, em função basicamente dos impactos negativos da COVID sobre o mercado de trabalho brasileiro, voltando a crescer lentamente a partir do início de 2022, chegando ao seu máximo de 36,9 milhões de empregos formais no final deste ano (Gráfico 1).
Gráfico 1: Número de empregos com e sem carteira de trabalho assinada* pelo setor privado e informais – Brasil – 4° trimestres de 2017/4° trimestre de 2022
Fonte: IBGE. * Exclusive trabalhador doméstico
Ao contrário do pretendido pela “pseudo” Reforma Trabalhista, no mesmo período acima referido, o setor privado brasileiro aumentou em cerca de 1,9 milhões de empregos sem carteira de trabalho assinada, passando de 11,3 milhões no quarto trimestre de 2017, para 13,2 milhões no último trimestre de 2022. Ademais, ela abriu espaço para a ampliação das aberrações trabalhistas como os informais, “uberizados”, precarizados, autônomos exclusivos, “empresários de si próprios” (ou falsos empreendedores), “pejotizados” que, em regra, são empregados disfarçados e que, em meados de 2021, já somavam mais de 31 milhões de trabalhadores.
O volume de desempregados também manteve-se elevado ao longo do período, oscilando entre 12 milhões e 14 milhões de pessoas, apresentado uma redução a partir de 2022 chegando a 8,6 milhões no quarto trimestre de 2022, quando ainda existiam 3,9 milhões de desalentadas (pessoas que estavam fora da força de trabalho porque não conseguiam trabalho, ou não tinham experiência, ou eram muito jovens ou idosas, ou não encontraram trabalho na localidade – e que, se tivessem conseguido trabalho, estariam disponíveis para assumir a vaga).
A evolução da massa salarial gerada pelo mercado de trabalho brasileiro entre o final dos anos de 2017 e 2022 reflete fortemente a ineficácia da “Deforma” Trabalhista implementada em 2017. Em termos reais (a preços do último trimestre de 2022) o total da massa salarial brasileira reduziu de R$ 345,0 bilhões em 2017 para R$ 285,1 bilhões no último trimestre de 2022, uma queda de 17,8% no período (Gráfico 2).
Gráfico 2: Massa salarial* – Brasil – quarto trimestre de 2017/quarto trimestre de 2022
Fonte: IBGE. *R$ milhões a preços constantes – 4° Trimestre de 2022
Além da Reforma Trabalhista ter se revelada ineficiente, os dados extraídos da Pesquisa de Endividamento e Inadimplência do Consumidor (PEIC), elaborada pela Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), mostram que o grau de endividamento das famílias brasileiras aumentou de 56,3%, em dezembro de 2017, para 72,8%, em março de 2023, chegando ao máximo de 77,0%, em outubro de 2022. Cerca de 2,9 milhões de famílias encontravam-se endividadas em março de 2023, sendo que 9,4% declararam que não teriam condições de pagar as suas dívidas.
Ocorre que, como a história nos demonstra, não são as normas que criam ou reduzem postos de trabalho, ampliam a renda do trabalho e a massa salarial. A introdução de um salário mínimo em 1º de maio de 1938, ao contrário do que argumentavam os empresários, não inviabilizou os negócios. Trabalhadores com melhor remuneração passaram a consumir mais, promovendo a expansão do mercado interno e, por consequência, a ampliação da indústria nacional. Por ocasião da promulgação da Consolidação das Leis do Trabalho – CLT, em 1º de maio de 1943, a classe empresarial protestava argumentando que seria impossível cumprir as exigências da legislação trabalhista e, caso essa fosse cumprida, os negócios se inviabilizariam. Como sabemos, a CLT não estabeleceu nenhuma regra nova, apenas reuniu, em uma único instituto legal, a legislação que se encontrava diluída em dezenas de leis, decretos e portarias. De toda forma, a resistência à implantação da CLT rendeu frutos ao empresariado, através de novas ações protecionistas e de incentivos fiscais por parte do governo da época.
Portanto, não será uma nova reforma trabalhista (como não foi a atual) que promoverá melhoria de postos de trabalho e renda à grande massa de trabalhadores. O que pode, efetivamente, reverter essa triste situação na qual se encontra a maioria dos trabalhadores brasileiros é a retomada do crescimento econômico, com o aumento do investimento público (que se coloca inclusive em contradição com as discussões sobre um “novo arcabouço fiscal”), com o estabelecimento de um ambiente de negócios mais estável, e o incentivo à produção e não ao rentismo, este estimulado pela obscena taxa de juros fixada, e injustificadamente mantida pelo Banco Central.
Sem essas providências básicas, e considerando que há um crescente endividamento das famílias, o cenário que se avizinha é o da estagnação econômica, com risco de estagflação, e queda acentuada na renda do trabalho e redução da massa salarial, acrescido do fato de que os sindicatos, desprovidos de sua renda principal e em franco processo de desestruturação, pouco poderão fazer para se opor e, mais, reverter esse cenário.
Grupo de Análise dos Impactos da Crise
Associação Brasileira de Economistas pela Democracia – ABED
Equipe Técnica: Adhemar Mineiro (Coordenação), Antônio Rosevaldo Ferreira da Silva, Eron José Maranho, Jaderson Goulart Junior, José Moraes Neto e Juarez Varallo Pont.