Quase todos os economistas poderosos frequentaram 1 de 6 escolas. Isso não é legal!

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Nova pesquisa mostra o quanto o campo da economia norte-americana se tornou estreito. As principais instituições “não acham que uma análise histórica completa, ou uma perspectiva feminista, ou uma perspectiva decolonial, ou uma perspectiva radical, seja economia”

Legenda: Harvard University Yard

Por Pete Mckenzie

Kevin Hoover teve o privilégio de escolher entre as melhores universidades do mundo. Economista iniciante no Federal Reserve Bank de San Francisco, ele havia sido aceito para os programas de doutorado de Harvard, MIT, Stanford e Oxford. Ele escolheu o último. Hoover se destacava em história e filosofia da economia, e o programa de Oxford era forte nessas áreas. Depois de se formar em 1985, ele sabia que queria trabalhar na academia. Mas quando voltou para a América do Norte, apesar de ter doutorado em uma das universidades mais prestigiadas do mundo, ele descobriu que “não tinha conexões”.

Foi a primeira vez que Hoover percebeu a existência do “oligopólio” no coração da profissão de economista, que canaliza o poder para um pequeno conjunto de instituições e marginaliza milhares de economistas que trabalham fora delas. Os graduados dessas instituições são sobrerrepresentados nas universidades uns dos outros, dominam a liderança da American Economic Association, monopolizam o Conselho de Assessores Econômicos do presidente e recebem a maioria das principais honrarias do campo. O resultado é uma rede de senhores que limita o desenvolvimento do conhecimento e ilustra a gravidade da obsessão dos Estados Unidos pelas melhores universidades, mesmo entre acadêmicos que pregam a importância de mercados competitivos.

“A economia é um campo científico hierárquico e oligopolizado”, diz Andrej Svorenčík, economista da Universidade da Pensilvânia, que recentemente foi coautor de um artigo sobre esse fenômeno em parceria com Hoover, agora professor da Duke University. “Alguns departamentos têm uma influência enorme em termos de produção de pesquisadores, colocação de pesquisadores na academia e influência ou controle da agenda de pesquisa.”

O artigo de Hoover e Svorenčík examina a liderança da American Economic Association – AEA, o poderoso corpo diretivo da profissão. De acordo com sua pesquisa, desde 1985, quase 70 por cento da liderança da AEA foram graduados em doutorado em Harvard, no Instituto de Tecnologia de Massachusetts, na Universidade de Chicago ou na Universidade de Stanford – uma super-representação impressionante, dado que cerca de 150 universidades norte-americanas têm programas de doutorado em economia.

Mas o predomínio dos egressos dessas instituições não se limita à AEA. Também se estende aos prêmios mais prestigiados da economia. Sessenta e cinco por cento dos laureados com o Nobel de economia desde 2000 receberam seu Ph.D. de uma das seis principais universidades do mundo para o estudo de economia: Harvard, MIT, Stanford, Princeton, Chicago e a Universidade da Califórnia, Berkeley. Esse domínio é ainda mais pronunciado para a Medalha Clark, ou “baby Nobel”: 83% dos medalhistas desde 2000 receberam seu Ph.D. de Harvard, MIT ou Stanford.

Os graduados dessas instituições de elite também exercem um poder político desproporcional. Desde que foi fundado em 1946, o Conselho de Assessores Econômicos da Casa Branca ajudou a traçar a direção econômica do país; seus membros estão entre os economistas mais influentes do país. Dos 32 economistas que serviram no conselho desde 2000, 24 receberam seus doutorados em Harvard ou MIT (mais três receberam doutorados em Chicago ou UC-Berkeley).

Este oligopólio é em parte um produto da história. Os programas de economia em Harvard e Chicago estão entre os mais antigos do país, o que lhes deu uma vantagem inicial na acumulação de prestígio e talento, diz Svorenčík. Outras instituições, como o MIT, tornaram-se gigantes por meio de laços profundos com programas existentes e sucessos iniciais no recrutamento de professores talentosos.

Mas o oligopólio também se entrincheira no presente. Os cargos de professor são destinados predominantemente para candidatos com Ph.D.s das seis principais instituições. Um estudo recente descobriu que dos 2.686 acadêmicos titulares nos 96 programas de economia norte-americanos mais bem classificados, mais de um terço recebeu seus doutorados das seis principais universidades. Quase 15 por cento receberam doutorado de apenas duas universidades: Harvard e MIT. Houve “pouca mobilidade ascendente” nas carreiras dos economistas, de acordo com o estudo, e “poucos professores de economia neste grupo lecionam em programas com classificação superior àquela de seu próprio programa de doutorado.”

O domínio dos graduados nas seis primeiras escolas é particularmente forte entre os professores das seis melhores universidades. Pelo menos metade dos professores de economia em cada uma das seis principais universidades recebeu seu Ph.D. de uma das seis principais universidades. No MIT, Harvard e Stanford – que estão empatados em primeiro lugar no mundo em economia pelo U.S. News & World Report – três quartos dos professores são doutorados formados pela melhores universidades. No MIT e em Harvard, 6 em cada 10 professores de economia receberam seus doutorados no MIT ou em Harvard.

O foco em um pequeno número de instituições de elite está enraizado em uma compreensão estreita de talento. Em um artigo de 2014 sobre economia no MIT, Beatrice Cherrier, historiadora econômica da ENSAE Paris, cita o professor do MIT, Robert Solow, que diz: “Para manter nossa posição na hierarquia, simplesmente devemos capturar um ou dois dos principais jovens economistas em cada geração sucessiva”. Solow disse mais tarde: “Qualquer conhecedor lhe dirá que existem apenas quatro jovens teóricos da economia matemática com menos de 30 anos dos quais vale a pena falar no mundo”.

Após a publicação do artigo de Cherrier, Jake Vigdor, professor de políticas públicas da Universidade de Washington, escreveu no Twitter que isso “reflete uma visão de mundo profundamente arraigada” de que “apenas o trabalho de um punhado de economistas realmente importa. Os milhares e milhares de economistas comprometidos com a profissão, do ponto de vista dos que estão no topo da hierarquia, ocupam-se com trabalhos sem importância e são principalmente úteis como potenciais empregadores para estudantes que não atingem o que deles é esperado”.

Claramente, diz Svorenčík, a economia é “um dos campos acadêmicos menos mobilidade ascendente”: em comparação com os programas de ciência política ou sociologia, é mais provável que o programa de doutorado de um economista determine sua carreira. “Uma possibilidade é que aqueles [no topo] sejam simplesmente os melhores”, diz Hoover. “Mas eu não aceito isso totalmente. Sua posição também tem relação com um conjunto diferente de oportunidades comparativamente a outras pessoas.” Outros economistas podem ser intelectuais tardios, ou podem ter vindo de origens mais pobres que dificultaram a entrada em programas de graduação de prestígio, onde poderiam obter referências de acadêmicos famosos. Outro estudo recente descobriu que a diversidade socioeconômica e racial daqueles com título de Ph.D. em economia é menor do que daqueles pertencentes a qualquer outro grande campo acadêmico.

Svorenčík acredita que o domínio de um pequeno grupo de departamentos de economia também pode prejudicar a inovação. “Pessoas semelhantes têm ideias semelhantes”, diz ele. “A competição é boa para os resultados.” É importante ressaltar que a homogeneidade das universidades de elite parece deixar muitos de seus graduados não familiarizados com outros aspectos cada vez mais importantes do campo. Um relatório de 2022 da Rethinking Economics, um grupo que pressiona pela reforma da formação em economia, descobriu que 78% dos estudantes de economia norte-americanos que eles pesquisaram não aprenderam sobre economia ambiental e 92% não aprenderam sobre economia feminista ou economia de estratificação. que tem como foco as desigualdades socioeconômicas.

“Você tem um escopo tão estreito do que é estudado e uma gama tão estreita de perspectivas”, diz Abigail Acheson, co-coordenadora da Rethinking Economics USA. As principais instituições “não acham que uma análise histórica completa, ou uma perspectiva feminista, ou uma perspectiva decolonial, ou uma perspectiva radical, seja economia”, concorda Nouhaila Oudija, também co-coordenadora da mesma instituição.

Oudija atribui esse descaso ao domínio das seis principais instituições. “Quando você tem o privilégio de ser um economista de Harvard ou algo assim, existe ego. Você acha que está certo e todo mundo está errado”, diz ela. “O establishment gera essa toxicidade organicamente.”

Curiosamente, um dos desenvolvimentos mais importantes da história econômica recente, a economia comportamental, veio de fora das seis principais universidades (e, na verdade, de fora da economia): seus primeiros proponentes, Amos Tversky e Daniel Kahneman, começaram como psicólogos na Universidade Hebraica de Israel. Richard Thaler, outro dos teóricos mais importantes da economia comportamental, recebeu seu Ph.D. em economia pela Universidade de Rochester.

Apesar desses problemas, no entanto, membros seniores da profissão muitas vezes parecem relutantes em reconhecer o problema. Depois de terminar seu artigo sobre a liderança da AEA, Svorenčík e Hoover entraram em contato com a American Economic Review, dirigida pela AEA, para ver se a revista estava interessada em publicar seu trabalho.

Hoover diz que não esperava que o editor da revista aceitasse publicar seu artigo. Mas quando o editor escreveu para dizer que havia sido rejeitado, ficou chocado com a razão alegada: a análise de Hoover e Svorenčík, disse o editor, não estava ligada a uma “questão de interesse geral”. Isso “mostra uma incrível insensibilidade àquilo que as pessoas consideram importante na profissão”, diz Hoover. Seu artigo foi posteriormente aceito por outro periódico.

Hoover não é particularmente prejudicado pelo oligopólio no coração da economia. “Não quero soar como alguém que ficou amargo por ter ficado de fora do campo da economia”, diz Hoover. “O mundo me tratou bem.” Depois de se formar em Oxford, ele acabou desembarcando na UC-Davis, de classificação média, chegou a o departamento de economia e depois mudou-se para a Duke University em 2006.

No entanto, há uma probabilidade “significativa” de que ele teria acabado em uma universidade de alto escalão no início de sua carreira “se eu tivesse escolhido qualquer uma das instituições em lugara de Oxford”, ele pensa. “Nunca teremos um sistema no qual … suas conexões não importem. Mas podemos meio que minimizar isso.”

No mínimo, diz ele, os economistas deveriam falar sobre o problema. “Não acho que haja nada nefasto nisso, mas é muito desagradável não se ter qualquer tipo de debate ou discussão sensata sobre o que queremos que a organização seja”.

Publicado originalmente por Slate | Tradução de César Locatelli

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