Falácias e silêncios no desenvolvimento da economia política convencional

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A economia política desenvolvida na Inglaterra na segunda metade do século XVIII avançou com base em falácias verbais e materiais e silêncios que vêm sendo reproduzidos na historiografia e na disciplina de economia até hoje.

por César Locatelli

“Quando me pediram para falar nessa palestra sobre o problema da produção de conhecimento no Sul global, me ocorreu que o problema era, na verdade, a produção de conhecimento no Norte global.” Assim a economista indiana Utsa Patnaik começou sua fala no décimo aniversário da revista tricontinental Agrarian South: Journal of Political Economy.

Ela entende que a teoria econômica convencional, que não existia de forma separada da política até meados do século XIX, é filha do imperialismo, do mesmo modo que Kathleen Gough se expressou sobre a antropologia. Sua tese é que, além do entrelaçamento de interesses econômicos e o desenvolvimento das teorias econômicas, a base factual da verdadeira história da ascensão do capitalismo industrial ficou oculta.

A crença mão invisível de Adam Smith ainda hoje ofusca “as bem visíveis ações de Estados altamente agressivos e belicosos que sustentaram os esforços das crescentes classes capitalistas em cada uma das nações marítimas europeias – Espanha, Portugal, França, Holanda e Grã-Bretanha – que lutaram arduamente entre si para obter o controle sobre rotas comerciais lucrativas e estabelecer colônias de conquista”, afirma Patnaik.

Além do “comércio à mão armada” com as colônias, além de monopolizar o mercado colonial para seus próprios produtos, a Grã-Bretanha realizou todos os esforços para impedir o uso de têxteis importados da Ásia, especialmente da Índia e da Pérsia. Foram quase 150 anos de uma política protecionista, de substituição de importações, que é rigorosamente ignorada pelos historiadores da revolução industrial e tida como prejudicial pela ortodoxia econômica.

Hobsbawn disse que “quem fala da revolução industrial fala do algodão”. Entretanto, em seus textos “não há uma palavra sobre as políticas protecionistas prolongadas que a Inglaterra adotou para evitar têxteis de algodão asiático, que duraram mais do que qualquer regime protecionista já visto na história”, denuncia economista indiana

Há fatos ausentes da história e das teorias econômicas que mudariam o entendimento do desenvolvimento, mesmo dos professores locais de boa fé, se fossem expostos de forma verdadeira. Patnaik reforça que: “A única maneira de fazer isso é sujeitar as teorias recebidas a análises rigorosas e críticas e, sempre que possível, recuperar os núcleos racionais, se existirem, de dentro de seu invólucro ideológico (para parafrasear uma ideia que Karl Marx apresentou, em um contexto um pouco diferente, de resgatar o método dialético da mistificação idealista)”.

A íntegra do ótimo artigo de Utsa Patnaik, Sobre economia política e suas falácias: porque críticas e repensar importam, traduzido por Bernardo Schirmer Muratt, reproduzido aqui, foi originalmente publicado no site Agrarian South.

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