Retomada do crédito à exportação de serviços pelo BNDES
29 de maio de 2025
imagem: Mihai Cauli
texto: Marcos de Queiroz Grillo
Encontra-se no Congresso Nacional o PL 5719/2023, construído em parceria com o TCU que certificou, junto com a CGU, a total transparência e regularidade da política de crédito à exportação de serviços do BNDES, contrariamente às fake news lançadas para justificar a suspensão do programa. Este PL propugna a retomada de tais financiamentos sem a necessidade absurda de aprovação de recursos pelo Congresso, medida preconizada pela PEC 03/23.
Nosso país enfrentou por muitas décadas uma severa escassez de divisas, verdadeiro gargalo para nossas importações e desenvolvimento nacional. Claramente, a única saída era a geração de divisas pelo aumento das exportações, meta constantemente buscada pelos países desenvolvidos que lançaram mão de políticas de financiamento às exportações de bens e serviços através de suas ECAs (Export Credit Agencies), aportando maior competitividade à oferta de seus itens exportáveis, como é o caso da KfW, que é o banco de desenvolvimento alemão, e da AFD, a agência francesa de desenvolvimento.
Era tempo de ditadura no Brasil, mas nossas autoridades tinham bem claros os objetivos das exportações de um país: encontrar mercado para os excedentes de sua produção e gerar divisas para pagar suas importações. Num país em crescimento e absorvedor de capitais estrangeiros, o aumento e diversificação da pauta de exportações é condição indispensável para arcar com os empréstimos contraídos e com o rendimento dos investimentos diretos externos. Daí a importância do crescimento das exportações brasileiras para viabilizar o processo de ajuste do balanço de pagamentos (tradicionalmente deficitário em conta corrente, com rígido controle cambial e com vários episódios de crises de desvalorização cambial e problemas de endividamento externo). É nesse contexto, onde a engenharia brasileira, muito qualificada e protegida durante tanto tempo por uma intransponível reserva de mercado, poderia se lançar na exportação de serviços de engenharia, principalmente para obras públicas no exterior, como um novo campo de absoluta importância para o país, em razão de seu know-how e sua vantagem comparativa, reafirmando a importância da exportação de serviços para o desenvolvimento nacional.
Essa tônica já vinha sendo compartilhada pelos nossos legisladores desde o início da década de 1970. E seguimos, assim, o exemplo dos países desenvolvidos e montamos nossas próprias políticas de financiamento às exportações de bens e serviços, o que foi feito, primeiramente, através da CACEX (Carteira de Comércio Exterior) do Banco do Brasil e, a partir de 1991, através do BNDES Exim.
A CACEX, que contou, por 15 anos, com o pioneirismo e genialidade de seu Diretor Benedito Fonseca Moreira, foi a precursora do crédito à exportação no Brasil. Com base na Resolução 68 do Conselho Nacional do Comércio Exterior (Concex), de 14 de maio de 1971, a CACEX deu início ao financiamento das exportações de serviços brasileiros utilizando recursos do FINEX (tesouro nacional), nas modalidades supplier’s credit (financiamento ao exportador), buyer’s credit (financiamento ao importador) e equalização de taxas de juros. Criou, até mesmo, o embrião do seguro de crédito à exportação que era, na época, o DDR (Dispensa do Direito de Regresso), que consistia em um desconto de até uns 2% sobre os reais recebidos pelos exportadores para eximi-los do risco de não pagamento das cambiais em dólares emitidas por eles contra seus importadores e descontadas junto ao Tesouro Nacional. Esses recursos iam para um fundo para bancar a eventual inadimplência. A CACEX, apesar de seu orçamento restrito, sempre foi um grande exemplo de excelentes serviços prestados ao Brasil. Ela foi desativada em 1990 pelo governo de Fernando Collor.
Em 1991, foi criado o PROEX que é um fundo de financiamento às exportações de bens e serviços e equalização de taxas de juros, criado pelo Governo Federal que conta com recursos do Tesouro Nacional previstos no OGU, administrado pelo Banco do Brasil e destinado a apoiar empresas com faturamento bruto anual até R$ 600 milhões, com prazos que variam de 60 dias a 10 anos, definidos de acordo com o conteúdo tecnológico da mercadoria ou complexidade do serviço prestado, podendo ser feito diretamente ao exportador ou ao importador.
Em 1990, com a criação do FINAMEX, o BNDES começou a financiar as exportações brasileiras de bens de capital. Em 1994, as operações de financiamento às exportações na modalidade pós-embarque, no BNDES, para países da América Latina passaram a utilizar o Convênio de Pagamento e Créditos Recíprocos da Associação Latino-Americana de Integração (CCR/Aladi), mecanismo que possibilitou a mitigação dos riscos e a redução dos custos das garantias a serem apresentadas para obtenção dos financiamentos às exportações aos países signatários. Em 1998, passou a financiar também a exportação de serviços, a exemplo do que mais de 90 países fazem, apoiando suas empresas na exportação de seus bens e serviços com o objetivo de conquistarem mercados. O CCR-Aladi também foi utilizado como instrumento de garantia de pagamentos nos financiamento à exportação de serviços. Os dois programas criados, BNDES Exim Pré-embarque e o BNDES Exim Pós-embarque vigeram com grande êxito até 2016, quando o Banco foi obrigado a suspender seus financiamentos às exportações de serviços, de engenharia, de serviços digitais, de audiovisual, etc., áreas em que o Brasil tem grande competência. Em 2019 o Brasil se retirou do CCR- Aladi.
Na ocasião da suspensão dos financiamentos à exportação de serviços, houve alegações de prejuízos para o BNDES, elevada inadimplência, desvio de finalidade, saída de divisas, dentre outras fake news.
Note-se que o BNDES desembolsa, aqui no Brasil e em reais, o valor do bem ou serviço em favor do exportador brasileiro, após ele ter comprovado a exportação. Por outro lado, o importador do bem ou serviço brasileiro, que pode ser desde uma empresa privada até um ente público estrangeiro, como um país, assume a dívida em divisas com o Banco. Fica claro, portanto, que nesses financiamentos não saem recursos do Brasil, já que as exportações são pagas em reais. Ao contrário, entram divisas no país, gerando empregos e estimulando a cadeia de fornecedores ligada aos bens ou serviços exportados. As empresas brasileiras de engenharia apoiadas pelo BNDES, que construíram diversas obras de infraestrutura no exterior, levaram consigo produtos brasileiros, máquinas, equipamentos e serviços de 4800 empresas fornecedoras. Setenta por cento delas eram de micro, pequeno ou médio porte. Os registros indicam que cerca de 35% do valor dos financiamentos corresponderam a máquinas, equipamentos e produtos brasileiros associados.
Segundo José Luis Gordon, diretor de Desenvolvimento Produtivo, Inovação e Comércio Exterior do BNDES, nos 25 anos em que apoiou exportação de serviços de empresas brasileiras, o BNDES desembolsou US$ 10,5 bilhões e recebeu de volta mais de US$ 13 bilhões. Trata-se, portanto, de uma atividade lucrativa para o Banco.
No tocante à inadimplência, é importante deixar claro que, no BNDES, ela é a menor de todo o sistema financeiro nacional (da ordem de 0,01%) e que, no caso do financiamento a serviços, ela está coberta por seguros de crédito à exportação, pagos pelo exportador ao Fundo de Garantia à Exportação, o FGE, criado em 1999 e que possui um patrimônio líquido positivo superior a US$ 8 bilhões.
Outro aspecto relevante é que esse tipo de financiamento leva a economia brasileira para fora, gera novos mercados, expande a economia, dinamiza nossas empresas e promove a entrada de divisas no país, alavancando exportações de bens e equipamentos brasileiros. E o faz da maneira “soft power”, na qual o país expande sua influência no mundo pacificamente, através de sua competência tecnológica, de sua cultura. Segundo Gordon, a participação do apoio público na pauta de exportação dos demais países é em média de 8% e, no Brasil, esse percentual é de apenas 0,3%. Ainda, segundo ele, 98% do mercado mundial está fora do Brasil e as empresas brasileiras precisam disputar esse espaço, até mesmo porque, segundo levantamento do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC), as 0,88% de empresas brasileiras que exportam respondem por 15% dos empregos mantidos no Brasil.
Já segundo Rafael Lucchesi, CEO da Tupy, ex-diretor da CNI e ex-presidente do Conselho de Administração do BNDES, a suspensão dos financiamentos do BNDES à exportação de serviços de engenharia, que já dura quase 10 anos, foi e continua sendo muito prejudicial ao país já que diminuiu muito a competitividade e o peso relativo do setor no cenário mundial e também no Brasil, onde começaram a entrar muitas empresas estrangeiras. Segundo ele, em 2015, a participação brasileira na engenharia mundial era de 5% enquanto a nossa participação no comércio mundial de US$ 103 trilhões, era da ordem de 2%. Com a paralização dos financiamentos à exportação de serviços de engenharia, nossa participação na engenharia mundial despencou de 5% para 0,5%.
O BNDES busca retomar o crédito à exportação de serviços, que é rentável para o Banco e fundamental para o país. Para isso tem trabalhado de forma transparente que garanta a retomada do programa com segurança jurídica para sua operação. O Projeto de Lei regula tal atividade com regras claras, com quatro pilares explicitados no texto da lei: (i) alinhamento com as práticas internacionais adotadas pela OCDE, (ii) transparência total, com todas as informações publicadas no site para consultas e apresentação anual do portfólio dos projetos à CAE do Senado Federal, (iii) suspensão dos créditos para clientes inadimplentes e (iv) criação de um Eximbank, uma subsidiária do BNDES como o Export-Import Bank of the United States, o Export-Import Bank of China, a India Exim Bank e a Africaneximbank. A criação de um braço do banco voltado para essa finalidade vai garantir segurança para o setor industrial, que teme o movimento de avanços e recuos nessa política. Esse braço apartado não implicará em nenhum custo adicional já que, para sua operação, continuará sendo utilizada a estrutura já existente no Banco. É pura e simplesmente uma sinalização importante ao setor empresarial quanto à perenidade do apoio à exportação de produtos brasileiros e à internacionalização das empresas nacionais.
Ficamos na expectativa de que o PL 5719/2023 seja aprovado na forma em que foi proposto.
publicação original:
https://terapiapolitica.com.br/retomada-do-credito-a-exportacao-de-servicos-pelo-bndes/

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