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A estimativa da desigualdade de rendas revisitada

8 de maio de 2025

imagem: ABED

texto: José Carlos Peliano

 

  A desigualdade de rendas é uma questão presente há tempos na análise econômica desde que as condições de vida da população começaram a chamar a atenção e pressionar a sociedade pelo aumento do contingente dos mais pobres. O contraponto era o acúmulo de riqueza em poucas mãos entre os mais ricos. Revoltas sociais localizadas ou não marcaram a insatisfação entre habitantes de regiões e países ao longo da história exatamente por conta da fome, pobreza, miséria e servidão de um lado em comparação à ganância, acumulação, gastança e despotismo de outros em reinos, feudos, vilas, cidades e nações.

  A desigualdade de rendas é estimada, em geral, por medidas estatísticas que avaliam as distâncias ou diferenças entre as rendas de indivíduos ou grupos e a renda média da distribuição total usada como referência. Entre as mais usadas e conhecidas1 estão a variância, o coeficiente de variação e os índices de Gini e de Theil. Por duas vezes este autor* desenvolveu medidas semelhantes com o mesmo objetivo2.

  Este texto apresenta uma alternativa adicional para estimar a desigualdade de rendas por meio de uma concepção com três expressões derivadas. A alternativa leva em conta as diferenças de renda entre duplas de indivíduos ou de grupos, ambos contíguos, e suas respectivas médias na série de renda da distribuição, tendo em conta que essas diferenças de rendas entre as duplas de indivíduos ou grupos são referenciadas à escala social de rendas onde estão classificados.

  A concepção alternativa para estimar a desigualdade de rendas

 

  Sejam xi as rendas e ni as frequências dos i-ésimos indivíduos ou grupos numa população de tamanho N, renda média da distribuição X e xii+1 a renda média de cada dupla de indivíduos ou grupos. Toma-se a renda média de cada dupla de indivíduos ou grupos nas respectivas faixas de renda com a seguinte ordenação, x1 ≤ x2 ≤ ... ≤ xN. As duplas são tomadas sem repetição, ou seja, x1 com x2 e n1 com n2 e assim sucessivamente até xN-2 com xN-1 e nN-2 com nN-1.

  A ideia por trás de tomar os indivíduos ou grupos dessa forma para o cálculo das medidas é a de entender que a desigualdade de renda entre eles começa a ser verificada entre cada par contíguo, sem se valer das distâncias entre cada e todos e a renda média da distribuição. Daí estimar as distâncias ou diferenças de renda entre cada dupla de indivíduos ou grupos para ver se permanecem iguais ou variam nas respectivas escalas de rendas entre períodos de tempo. Quanto mais se distanciem maior a desigualdade e vice-versa.

 


 

* Mestre em economia pela Universidade de Vanderbilt/USA; Doutor em economia pela Unicamp/SP e membro da Associação Brasileira de Economistas pela Democracia (ABED).
1 Outras medidas em Hoffmann, Rodolfo; Botassio, Diego e de Jesus, Josimar, Distribuição de Renda – Medidas de
desigualdade, pobreza, concentração, segregação e polarização. EDUSP, 2019, São Paulo.
2 Peliano, José Carlos, Medidas e Concepções da Desigualdade de Renda: Uma Contribuição em Estudo no Caso Brasileiro. Tese de Mestrado. Universidade de Vanderbilt, Nashville, Tennessee, USA; Distribuição de renda e Mobilidade Social no Brasil: A Ordem e o Progresso Desiguais, 1992. Tese de Doutorado, Instituto de Economia, Unicamp, São Paulo, e Income Distribution Movements: A Case Study of Brazil. Academia EDU, 2015.

 


 

A alternativa e suas expressões


As distâncias (diferenças) entre as rendas xi e xi+1 divididas por N e X, onde xi ≤ xi+1, xi ≤ xii+1, e xii+1 ≤ xi+1, serão

ni+1 (xi+1 – xii+1) / (N.X) (1) e ni (xii+1 – xi) / (N.X) (2)

As somas (S) respectivas de (1) e (2) são


A medida3 P varia entre 04 e @ 15 para xi ≥ ??, bem como as medidas relacionadas P1 e P2.


As expressões (5) e (6) podem também ser usadas isoladamente como medidas de desigualdade por se referirem às expressões apresentadas em (3) e (4), cujas somas dos intervalos das rendas de cada faixa, de um lado, das maiores (xi+1) e, de outro, das menores (xi) que a média (xij) são semelhantes - o que ultrapassa de cada renda i+1 ou de todas elas acima da média do par (indivíduo ou grupo) é exatamente o que falta em cada renda i ou no total delas abaixo da média do par.

A concepção alternativa da desigualdade, portanto, começa em (3) e (4) ao entendê-la tanto a partir das rendas maiores que as médias dos pares quanto das rendas menores que as médias dos pares. A desigualdade pode, assim, ser medida não só pelo excesso de renda apropriado pelos indivíduos ou grupos com valores acima das médias dos pares de renda (3), como também pelo que falta de renda aos indivíduos ou grupos com valores abaixo das médias dos pares (4). Do total de renda gerada na sociedade esta medida de desigualdade vai mostrar claramente que o que sobra acima da média de renda de alguns indivíduos ou grupos é o que falta abaixo dela para outros indivíduos ou grupos. Ou a riqueza relativa é do tamanho da pobreza relativa vistas e estimadas pela ótica da distribuição de renda.

 


 

3 A medida e suas expressões atendem a condição de Pigou-Dalton porque sensíveis às transferências de renda das rendas
mais baixas às mais altas (e vice-versa).
4 P=[(ni+1/N) - (ni/N) + (ni/N) - (ni+1/N)]/2 = 0.
5 P= 1/2[(N/N-0) + 1/N [(N-1)/N -1/N] = 1/2 (N/N + 1/N [(N-1)/N -1/N)] = 1/2 [N/N + (N-2)/N) = 1/2 (2N-2)/N = (N-1)/N

 


 


Aplicação da medida


A medida P e suas variantes foram testadas em dados fornecidos pelo IPEA6, utilizando na tabela 1 a seguir os dados da tabela 5 (PNAD Contínua: proporção de domicílios por faixa de renda do trabalho (1o trim/2020 – 3o trim/2024) e a tabela A.2 do Apêndice A (PNAD Contínua: rendimento médio habitual real domiciliar por faixas de renda). Os dados para o Coeficiente de Gini foram obtidos da Carta de Conjuntura e complementados por informação fornecida pela Diretoria de Estudos e Políticas Macroeconômicas (Dimac/Ipea).

Os cálculos efetuados para as medidas estão a seguir :



Os resultados encontrados mostram a boa aderência de P e suas variantes em relação ao Coeficiente de Gini. Embora sejam construídos com concepções diversas suas evoluções entre 2020 e 2024 seguem próximas umas das outras à leve exceção de 2022 para 2023 (entre P e Gini1) e 2021 para 2022 (entre P e Gini2). De fato, estas exceções podem ser atribuídas a 3 fatores: primeiro, o fatode as variações de desigualdade no período estarem bem reduzidas, muito próximas umas das outras,

 



6 Carta de Conjuntura 65, Nota de Conjuntura 19, 4º trimestre, 2024.

 



as quais são afetadas pela sensibilidade operacional de cada medida; segundo, a fonte original dos dados; o IPEA utilizou dados obtidos diretamente do IBGE, portanto mais completos, enquanto este texto se valeu do resumo informativo publicado na Carta de Conjuntura do IPEA – quanto mais dados disponíveis (caso do IPEA) mais acurado o cálculo; e terceiro, os eventuais arredondamentos dos dados quando se trata de números decimais.
 

  A simples apresentação dos resultados com apenas duas casas decimais, no entanto, já mostra a exata concordância das estimativas apresentadas por P e Gini com relação às variações observadas ao longo do tempo. De todas as formas, a evolução de P no período bem próxima à de Gini reflete boa dose de precisão em sua capacidade de estimar com eficiência a desigualdade de renda.

Particularidade da medida P


Dada a expressão de P (7) observa-se que seus dois elementos constituintes podem ser usados para saber mais sobre a conformação da estimativa da desigualdade de renda. Assim,
 

 

  No primeiro termo, trata-se das diferenças nas participações relativas de renda e no segundo das diferenças nas frequências relativas. Isto significa que a expressão final da desigualdade fornecida por P tem condições também de indicar se foram mais as variações das participações das rendas relativas ou das frequências relativas que influenciaram o resultado de P.


  Os cálculos feitos para os dados da tabela 1 registraram para 2020 P= 0,318, 0,1057 e 0,2124, e para 2024 P= 0,306, 0,1011 e 0,2050, respectivamente para os efeitos renda e frequência (em negrito). Estes resultados mostram que o efeito frequência foi o que mais influenciou P – 66,8% e 67,0 respectivamente. A concentração acentuada de domicílios nas faixas mais baixas de renda pesou mais que as variações dos diferenciais de renda entre as faixas – por mais que as rendas tivessem se afastado umas das outras não foram elas responsáveis pelo perfil da desigualdade, mas a persistência de domicílios com as rendas mais baixas.


  Por fim, as percentagens indicam ter havido uma rigidez na distribuição das participações de renda e frequência entre os domicílios de sorte a manterem a desigualdade praticamente estável – mesmo tendo ocorrido movimentações nestas participações no período (tabela 1).

 

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