O colapso global é iminente
8 de abril de 2025
imagem: ABED
texto: Maria Luiza Falcão Silva
Paul Krugman, Prêmio Nobel de economia em 2008, por suas contribuições para a Nova Teoria do Comércio e a Nova Geografia Econômica, analisando o tarifaço imposto aos países que comercializam com os Estados Unidos, em 2 de abril deste ano, argumenta: “Na verdade, é sem dúvida enganoso dizer que Trump começou uma guerra comercial. Pode ser mais preciso dizer que, ao demolir o sistema de comércio mundial, ele desencadeou o caos. E o mundo inteiro pagará o preço”. As tarifas de Trump não encontram respaldo entre economistas de várias tendências quer seja da ortodoxia, quer seja da heterodoxia.
Internamente, um órgão consultivo foi criado por Donald Trump, o Departamento de Eficiência Governamental (Doge) e foi entregue a Elon Musk, o homem mais rico do mundo, para implementar a ideia de Estado Mínimo. Musk cortou empregos no governo e outros gastos. A ideia de Musk é reduzir drasticamente a força de trabalho federal e eliminar o que ele vê como desperdício de dinheiro dos contribuintes. Inicialmente, acenou com uma economia de até US$ 2 trilhões. Como parte de uma guerra contra as políticas ‘woke’, Musk disse que sua equipe "economizou aos contribuintes mais de US$ 1 bilhão em contratos DEI [diversidade, equidade e inclusão]”. Atacou a USAID, principal organização de ajuda externa dos Estados Unidos, que financia projetos em dezenas de países. Avançou sobre gastos obrigatórios, incluindo programas populares como Previdência Social e Medicare.
A reação dos Democratas (partido rival) tem sido tímida. Talvez até de perplexidade como todos nós.
A sociedade americana começa uma reação ainda muito incipiente, protestando em várias cidades. Nem tanto pelo tarifaço, com o qual a população americana parece concordar pois os efeitos sobre os preços ainda não se tornaram claros, leva um tempo para serem sentidos pelas pessoas nos supermercados e nas lojas de varejo. Mas por razões diversas que variam da expulsão de imigrantes, supressão de direitos básicos como o de criticar o governo, ao desmonte das Universidades que viram sua autonomia para o livre pensar ameaçada e recursos públicos direcionados à educação superior e às pesquisas minguarem.
Em várias cidades ocorreram protestos, mas ainda isolados. Na capital Washington, milhares de manifestantes se reuniram, no final de semana, para acompanhar discursos de políticos democratas. Muitos citaram Elon Musk. O deputado da Flórida Maxwell Frost denunciou a "tomada de nosso governo por bilionários".
Mas o que de fato está em jogo? Parece-me que é um abalo sísmico no modo capitalista de produção e distribuição. É um ataque à globalização e ao neoliberalismo realizado por uma pessoa que o apoia, mas não tem noção do que se trata e a quem realmente beneficia.
Em seu estreito modo de pensar Trump só enxerga que o país mantém um déficit em seu comércio com inúmeros países porque exporta (X) menos do que importa (M) e isso tem que ser combatido país a país. Desconhece todas as teorias sobre vantagens decorrentes do comércio internacional para economias abertas. Ignora o papel dos EUA, obrigações e privilégios, enquanto emissor da moeda hegemônica – o dólar americano.
Richard Wolff, economista marxista e crítico do capitalismo, analisa o período de Donald Trump como um catalisador do declínio estrutural dos Estados Unidos e das contradições do sistema capitalista: a desigualdade social, a exploração do trabalho e a concentração de riqueza.
As ideias de Wolf sobre o destino do capitalismo na era Trump, com auxílio de IA, podem ser assim resumidas:
1. Aceleração da desigualdade e declínio imperial
Wolff argumenta que a concentração de bilionários no governo Trump reflete uma oligarquia que aprofunda a desigualdade social, tornando o sistema insustentável. Ele compara o momento atual à Era Dourada (Gilded Age) dos anos 1890 nos EUA, onde a riqueza extrema de elites - como hoje são os Musk, Zuckerber e Bezos - contrastava, com a precariedade da classe trabalhadora. Essa dinâmica, pode acelerar o colapso de um império estadunidense já em declínio, com perda de influência global e desgaste do dólar como moeda hegemônica.
2. Políticas protecionistas e desespero econômico
As tarifas comerciais impostas por Trump são vistas por Wolff como medidas desesperadas para conter o declínio econômico dos EUA, mas que, na realidade, agravam crises internas. Ele critica a narrativa de "vitimização" dos norte-americanos, apontando que as elites capitalistas foram as maiores beneficiárias da globalização. As tarifas, além de inflacionarem preços para os trabalhadores, arriscam recessão e perda de mercados externos devido a retaliações, acelerando a erosão da hegemonia estadunidense.
3. Negação do declínio e teatro político
Wolff destaca que tanto Trump quanto os Democratas evitam discutir a decadência do imperialismo americano, preferindo culpar "inimigos externos" (como China ou Rússia). Essa negação, associada a políticas beligerantes (ex.: apoio a Israel, guerra na Ucrânia), só aprofunda a crise. Para ele, as eleições são um "teatro da democracia", onde ambos os partidos perpetuam o capitalismo sem oferecer alternativas reais.
4. Crise estrutural do capitalismo
Sob Trump, Wolff identifica problemas como o endividamento público recorde (121% do PIB em 2024), déficits fiscais crescentes (6,4% do PIB) e dependência de empréstimos estrangeiros. Esses fatores, somados à desdolarização global (impulsionada pelos BRICS), tornam o sistema financeiro dos EUA vulnerável a colapsos. A obsessão com gastos militares e a falta de investimentos sociais agravam a instabilidade.
5. A necessidade de uma alternativa sistêmica
Wolff defende que o capitalismo, em sua forma atual, é incapaz de resolver suas contradições. Ele critica a falta de democracia nos locais de trabalho e a exploração estrutural, propondo a organização dos trabalhadores para além de reformas pontuais. Para ele, a era Trump evidencia a urgência de um modelo alternativo, como cooperativas ou socialismo democrático, que enfrente as raízes das desigualdades.
Para Wolff, a era Trump representa um ponto de inflexão: políticas neoliberais e nacionalistas aceleram o fim da hegemonia estadunidense, enquanto o capitalismo se revela cada vez mais disfuncional. Sua análise combina crítica econômica rigorosa com um apelo à transformação radical do sistema, evitando a catástrofe social e geopolítica.
O ganhador do Nobel em economia de 2001 já advogava que repensar a globalização significa repensar as relações entre o Estado e o mercado. Joseph Stiglitz acredita, na esteira de Keynes, que é urgente definir o que ele chama de “terceira via”, entre o neoliberalismo e a coletivização completa da economia, que se mostrou ineficaz. Não há mão invisível, e a intervenção do Estado pode muitas vezes dar resultados melhores do que o livre mercado. Entretanto, atualmente, são os fanáticos do mercado que dão as cartas. As consequências da liberalização financeira e da especulação são catastróficas.
Banqueiros, executivos e traders manifestaram na semana passada, após o anúncio do tarifaço do governo dos Estados Unidos, que vislumbravam flashbacks da crise financeira global de 2007-08, a crise do subprime que derrubou vários gigantes de Wall Street e de outros mercados financeiros mundo afora. Muitos especialistas também viram, no colapso de 2008, uma séria ameaça ao capitalismo, causando uma recessão global e afetando a economia de quase todos os países. A crise além de desestabilizar os mercados financeiros, diminuiu a produção industrial, causou desemprego em vários setores, afetou a confiança dos investidores, abalou a economia mundial.
Em 15 setembro de 2008, marco da crise, um dos bancos de investimento mais tradicionais dos Estados Unidos, o Lehman Brothers, foi à falência, e as Bolsas despencaram. A data ficou conhecida como ‘segunda-feira de terror’. Em seguida, outros bancos anunciaram perdas bilionárias. Quem os socorreu foram os bancos centrais apelando para sua função de “emprestador de última instância”.
Hoje, nesta segunda-feira, sete de abril de 2025, as Bolsas mais uma vez abrem com os mercados de ações globais cambaleando. Estima-se que as 500 pessoas mais ricas do mundo perderam coletivamente US$ 536 bilhões (£ 417 bilhões) nos dois primeiros dias de negociação, após o anúncio do tarifaço de Trump. Foi a maior perda de riqueza, em dois dias, já registrada pelo índice de bilionários da Bloomberg.
Até agora, neste ano, a riqueza estimada de Musk, apoiador de Trump desde o primeiro momento, e chefe do Doge que quer desmontar o Estado americano, caiu em US$ 130 bilhões, embora ele ainda permaneça confortavelmente como a pessoa mais rica do mundo, com um patrimônio líquido de US$ 302 bilhões. As ações da Tesla caíram quase 5% em Wall Street na tarde de segunda-feira, aumentando essas perdas. Grupos de magnatas que apoiaram Trump ou compareceram à sua posse em janeiro viram sua riqueza diminuir, de forma considerável, atingidos pela turbulência do mercado.
O colapso parece iminente, liderado pelas empresas de big tech. Quem os vai socorrer? A era Trump exacerba tensões inerentes ao capitalismo - desigualdades, nacionalismo econômico, crises sucessivas - e poderá colocar em risco instituições democráticas. Mas não será suficiente para levar ao fim o sistema capitalista ou nos conduzir para um modelo alternativo, como um modelo de cooperativas ou socialismo democrático, que enfrente as raízes das desigualdades, como sugere Wolff. Mais fácil levar a conflitos de proporções cada vez maiores, como uma Terceira Guerra Mundial, para criar consumidores para produtos bélicos cuja produção se amplia em todos os continentes.
O capitalismo tem uma capacidade imensa de adaptação a novas situações. O que está em jogo, não é o fim do capitalismo, mas sua contínua transformação. Seja para um modelo mais regulado ou para uma versão mais oligárquica e polarizada. Seu núcleo – propriedade privada, lucro e mercado – segue inabalável.

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