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Governo Trump: ameaças e possibilidades para a economia brasileira

11 de março de 2025

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imagem: ABED

texto: Juliane Furno e Pedro Faria

 

O início do mandato de Donald Trump enseja numerosas especulações sobre o futuro. Diversos temas tomam novos contornos, como areorganização e a possibilidade de maior fôlego da extrema direita; a problemática humanitária com o tema das imigrações; e a urgência das questões ambientais, negligenciadas pelo negacionistas climáticos, para ficar nos principais. No campo econômico, o governo Republicano também tensiona as análises daqueles que apostavam em uma saída mais “estável” do ponto de vista da opção por um neoliberalismo de características mais tradicionais, representado pela candidatura de Kamala Harris.

Desde 2008 o capitalismo vive mais uma das suas crises cíclicas. No entanto, diferentemente das crises anteriores, essa parece ainda não ter cumprido o seu desígnio de reorganizar os capitais em um grau qualitativamente superior de acumulação, retomando suas taxas de crescimento sob novas modalidades de exploração dos mais pobres. De lá pra cá, muito embora os trabalhadores estejam pagando pela crise, as taxas de crescimento e dos lucros dos capitalistas não voltaram à “normalidade”. A solução para a crise do capitalismo neoliberal foi encontrada dentro dele próprio, na medida em que gestou novas variantes do neoliberalismo, agora prescindindo de algum liberalismo nos valores e apostando em saídas conservadoras e autoritárias na política para preservar as liberais na economia.

Esse cenário de mudança, paradoxalmente, colocou em xeque as próprias instituições erigidas pelos EUA na virada da década de 1980, expressas na globalização produtiva e financeira e na plena liberdade comercial. A globalização produtiva deslocou parte importante da indústria para o Leste Asiático, deslocando os típicos empregos de classe média da economia americana para a China e ameaçando a hegemonia norte-americana no campo tecnológico e agora, também, monetário-financeiro.

Buscando retomar seu protagonismo, em tempos de crise capitalista e de ameaça ao imperialismo estadunidense, Donald Trump propõe à economia americana aquilo que a fez forte no passado: protecionismo e forte ativismo estatal para garantir a acumulação privada nacional. É sob esse cenário que conseguimos entender melhor os possíveis impactos das medidas propostas de política econômica para o Brasil.

Os primeiros possíveis impactos são os mais óbvios e mais diretos: as medidas protecionistas, com tarifas de importação entre 10 e 20% e de até 100% para alguns setores da economia chinesa, deve significar um esfriamento dos fluxos no comércio mundial, e para o Brasil – que tem nos EUA seu segundo maior parceiro comercial – pode significar redução das nossas exportações, especialmente ferro e aço. As medidas protecionistas também podem ter efeitos indiretos: a redução da demanda norte-americana por manufaturados chineses pode reduzir a demanda chinesa por produtos primários brasileiros (minério de ferro, petróleo cru). Menos exportações impactam negativamente a nossa balança comercial, o que impacta a nossa formação de reservas internacionais.

Além disso, com os produtos importados custando mais caro aos cidadãos americanos, a tendência é que haja elevação dos preços domésticos, impactando no aumento da inflação. Como os Bancos Centrais costumam tratar a inflação como um problema meramente monetário, sua forma de atenuar o aumento de preços costuma ser via elevações da taxa básica de juros. Dado o caráter dependente da economia brasileira e a posição frágil do real na hierarquia internacional de moedas, qualquer aumento nas taxas de juros americanas significa aumentos maiores na nossa taxa básica de juros, a Selic. O impacto da taxa de juros elevada é o encarecimento do crédito e aumento das despesas financeiras de empresas e famílias, causando redução do investimento, queda no consumo e desaceleração econômica, com impactos deletérios sobre o emprego e a renda.


Há, ainda, a possibilidade de manutenção de uma política de dólar forte, tanto em função do aumento da taxa de juros americana quanto em função da desorganização do cenário internacional, que impele aos donos do dinheiro um comportamento de aversão ao risco, mantendo seus recursos no lugar mais seguro, que são os títulos da dívida
pública americana, em detrimento da sua operação em outras economias, como a brasileira. Com o dólar valorizado, as importações brasileiras ficam mais caras, com impactos na elevação do custo de vida e pressões inflacionárias internas, pela via da taxa de câmbio.

No entanto, há um outro impacto, indireto, que pode nos ser benéfico, se soubermos aproveitar a oportunidade com soberania. As ações iniciais do governo Trump indicam um maior acirramento dos conflitos políticos e da guerra comercial com a China. No entanto, nas primeiras semanas de mandato, a confrontação com a China ficou em segundo lugar, com Trump dando preferência a uma tentativa de reorientar a relação com seus aliados mais próximos da Otan e com países vizinhos, como Canadá e México. Neste cenário de maior tensão entre as grandes potências econômicas e de desorganização da coalizão de aliados dos Estados Unidos, as margens de manobra para os países periféricos barganharem nessa disputa costumam ser maiores. O Brasil é um país de caráter estratégico, ambas as nações devem buscar uma maior aproximação visando a um melhor posicionamento político e econômico, não somente aproveitando-se das nossas potencialidades internas, mas da liderança do Brasil na América Latina. Nesse sentido, surgem arestas para barganhar melhores acordos, transferência de tecnologia e acordos de cooperação.

A reorientação geopolítica pode se traduzir em oportunidades econômicas para o Brasil, principalmente a partir do abandono da agenda de combate à crise climática e transição energética por parte dos EUA. O fim do Inflation Reduction Act (IRA) deve reduzir os incentivos para investimentos verdes nos EUA, que podem ser atraídos para o Brasil. Setores como biocombustíveis, energia renovável (eólica, solar) e combustíveis verdes (hidrogênio verde e seus produtos) se apresen-
tam como candidatos para atração de investimentos, dada as vantagens competitivas e geográficas do Brasil.


Em nossa avaliação, o melhor caminho para o Brasil seria apostar no isolamento da economia americana na região, aproveitando o momento de tensão para potencializar alianças que contribuam para um mundo mais multipolar. Dessa forma, privilegiar a atuação junto aos Brics como um bloco que vocaliza mais do que interesses pragmáticos/comerciais, mas tendo como identidade central os países do Sul Global, poderia ser um caminho de enfraquecimento do imperialismo americano, sobretudo mediante o enfraquecimento do dólar como moeda reserva e de trocas internacionais e buscando construir acordos com países que se pautam por outras lógicas de compartidas, especialmente prezando pela autodeterminação nacional.


Além disso, o Brasil é o membro fundador dos Brics, que mantém relações mais próximas com os países da esfera de influência norte-americana (União Europeia, México, Canadá, Colômbia), que estão sendo forçados a repensar sua relação com Washington. Este posicionamento permite que o Brasil possa atuar como facilitador na ampliação do relacionamento destes países com o bloco dos Brics, liderado por China e Rússia. Desta forma, seria possível acelerar o enfraquecimento do imperialismo americano, contribuindo para uma rota de fuga para os países sob a esfera de influência dos Estados Unidos.

 

publicação original:

Jornal dos Economistas. Edic¸a~o 427 - Marc¸o/2025

https://www.corecon-rj.org.br/corecon/ckfinder/userfiles/files/jornal_economista/0325cel.pdf

 

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