Associação Brasileira de Economistas pela Democracia

Defesa da Democracia, da Soberania Nacional e do Desenvolvimento Inclusivo e Sustentável do Brasil

 

 
 
 

 

O mercado de trabalho brasileiro e os impactos negativos do aumento da taxa selic

1 de novembro de 2024

imagem: ABED

O mercado de trabalho brasileiro, que se constitui em um grande elo entre a dinâmica da atividade econômica e as condições de sobrevivência da sua população, apresentou uma evolução significativamente favorável nos últimos doze meses, sendo que alguns indicadores que retratam esta realidade, chegaram a atingir recordes históricos. Observou-se aumento na sua dimensão, no número de pessoas ocupadas e na massa salarial gerada, redução do número de pessoas desempregadas, da taxa de desocupação e do número de pessoas desalentadas. Esta evolução positiva ocorreu paralelamente a um processo de queda da taxa SELIC que passou de 13,75% em agosto de 2023 para 10,50% em setembro de 2024, voltando a crescer para 10,75% na última reunião do Comite de Política Monetária – COPOM do Banco Central do Brasil.
Neste contexto, quais os motivos que levaram o BACEN a subir de novo a taxa SELIC e, no curto e médio prazo, quais os seus principais impactos sobre a o merca desempenho do de trabalho brasileiro?
Os dados divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE através da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua – PNAD Contínua Mensal, com o trimestre móvel encerrado em julho, indicam que o mercado de trabalho brasileiro atingiu no trimestre de maio/junho/julho de 2024 seu recorde histórico de 109,5 milhões da população economicamente ativa – PEA (na série histórica da PNAD iniciada em 2012), superando em 1,6 milhão de pessoas observado no mesmo período em 2023 e em 443 mil de pessoas em comparação ao trimestre anterior (fevereiro/março/abril).
Da mesma forma, no mesmo período, o total de Pessoas Ocupada - PO também atingiu o seu recorde de 102,0 milhões de pessoas, ultrapassando em 2,7 milhões de pessoas no mesmo trimestre do ano 2023 e em 1,2 milhão em comparação ao trimestre anterior.
Em ambos os períodos, quase a totalidade deste crescimento (99,4% e 94,1%, respectivamente) ocorreu com contratação de trabalhadores inseridos no mercado de trabalho formal como assalariados (com e/ou sem carteira de trabalho assinada), cabendo a menor parcela ao aumento de trabalhadores inseridos no segmento informal como empregadores, conta-própria e trabalhador familiar auxiliar. O trabalho doméstico considerado como categoria à parte, reduziu em termos absolutos o número de pessoas ocupadas nestes períodos considerados (45 mil e 35 mil pessoas, respectivamente).
Em termos setoriais este crescimento ocorreu principalmente nas atividades vinculadas à prestação de serviços (76,5%), especialmente naquelas vinculadas às atividades de informação, comunicação e atividades financeiras, imobiliárias, profissionais e administrativas (+682 mil pessoas ocupadas), de administração pública, defesa, seguridade social, educação, saúde humana e serviços sociais (+654 mil pessoas), sendo também significativo o crescimento de comércio de mercadorias (+482 mil pessoas). Por outro lado, observou-se redução de pessoas ocupadas nas atividades agropecuárias (-364 mil pessoas), o que já era esperado em razão da rápida automação do setor e a dinâmica das safras, e uma relativa estabilidade nos serviços domésticos (-27 mil pessoas).
A massa de rendimento real habitual (soma de todos os rendimentos) chegou a R$ 322,4 bilhões no trimestre de maio/junho/julho de 2024, crescendo 7,9% em relação ao mesmo período de 2023. Neste mesmo período o rendimento real habitual mensal de todos os trabalhos (R$ 3.206,00) aumentou cerca de 4,8% no ano, embora tenha sido estável em relação ao trimestre anterior.
A população desempregada reduziu para 7,4 milhões de pessoas, o menor volume desde o trimestre encerrado em janeiro de 2015, e a Taxa de Desocupação reduziu para 6,8% no trimestre, também a menor para um trimestre encerrado em junho na série histórica da PNAD Contínua, iniciada em 2012. Por sua vez, a população desalentada, da mesma forma, reduziu consideravelmente, chegando a 3,2 milhões de pessoas, atingindo menor contingente desde o trimestre encerrado em junho de 2016 recuando 12,2% (menos 447 mil pessoas) em relação ao mesmo trimestre de 2023.
A melhora do mercado brasileiro, em grande medida, por um lado se associa a políticas públicas adotadas pelo governo federal, como a ampliação do Programa Bolsa Família e do aumento real do salário mínimo e, por outro, ao estimulo ao crédito disponível às famílias, como os empréstimos consignados calcados em menores taxas de juros que estimularam o aumento do consumo interno. Destaque-se que a modesta recuperação de concessões de crédito também atingiu as pessoas jurídicas, tanto nas de pequeno e médio porte, quanto nas de maior dimensão, especialmente aquelas vinculadas às atividades industriais, contribuindo para a retomada em ativos fixos e perspectivas de aumento da produção interna em inúmeros segmentos.
Essa melhora do mercado de trabalho, através de seus efeitos multiplicadores, resultou em um aumento do Produto Interno Brasileiro – PIB que apresentou um crescimento de 1,4% no segundo trimestre de 2024 se comparado ao trimestre anterior e de 3,3% em relação ao mesmo trimestre de 2023, superando consideravelmente as expectativas do COPOM que era de 2,68% para 2024. Este crescimento PIB, pela ótica da demanda, concentrou-se Consumo das Famílias (aumento de 4,9%), superando, por um lado, as expectativas do próprio BACEN e, por outro, refletindo o avanço do mercado de trabalho que beneficiou o aumento do consumo das famílias, especialmente daquelas com menor nível de renda.
Foi neste contexto favorável do desempenho do mercado de trabalho e da economia brasileira que o COPOM aumentou, sem nenhuma justificativa técnica consistente, a taxa SELIC para 10,75%, a qual teria como objetivo conter a inflação que seria estimulada com o aumento do consumo. Entretanto, a inflação do período se comportou em sentido inverso, reduzindo para -0,02% em agosto de 2024, constituindo-se na primeira deflação do IPCA no ano e a menor variação para o mês de agosto desde 2022. A inflação acumulada em doze meses cedeu para 4,24%. Ademais, entre julho e agosto de 2024, observou-se uma redução dos preços da Cesta Básica calculada pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) nas dezessete capitais brasileiras pesquisadas, com destaque para as verificadas no Rio de Janeiro (-6,97%), Aracaju (-6,71%), Belo Horizonte (-6,39%), Brasília (-6,04%), Recife (-5,91%) e Salvador (-5,46%).
Os efeitos deste inexplicável aumento da taxa SELIC resultam em aumento das taxas de juros praticadas pelo mercado, que já são extremamente elevadas, inibindo o consumo interno, especialmente das pessoas com menor renda, com efeitos negativos sobre o volume de empregos e massa salarial gerados, os quais vinham contribuindo significativamente para o crescimento do PIB neste período mais recente. Todos os trabalhadores, empregados no setor formal quanto informal, assim a grande maioria dos setores da atividade econômica, especialmente os de comércio e de serviços serão impactados negativamente com esta decisão do COPOM-BACEN. Para além disso, a Formação Bruta de Capital também é afetada de forma negativa, à medida em que as taxas de juros praticadas praticamente inviabilizam investimentos que impactariam a produção interna, que poderiam contribuir para o aumento da oferta de produtos internamente e pressionando os preços para baixo, contribuindo para uma estabilidade e/ou queda da inflação brasileira. Vale aqui salientar que a redução da atividade econômica traz em seu bojo, a queda da arrecadação tributária, contribuindo para pressionar ainda mais o orçamento fiscal.
A majoração da taxa SELIC, da forma como foi implementada, apenas favorece o sistema financeiro rentista, ao mesmo tempo em que impacta diretamente na piora das condições de sobrevivência da população brasileira.

 

Grupo de Análise dos Impactos da Crise

Associação Brasileira de Economistas pela Democracia – ABED

Equipe Técnica: Ademir Figueiredo, Adhemar Mineiro (Coordenação), Antônio Rosevaldo Ferreira da Silva, Eron José Maranho, Jaderson Goulart Junior, José Moraes Neto e Juarez Varallo Pont.

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